A Pergunta Que Rasga a Alma
Se Deus é perfeito, sabe de tudo e já conhece o futuro… por que Ele permitiu o mal no mundo?
Essa é a pergunta que ecoa desde os primeiros filósofos até o coração mais simples que olha para o céu em silêncio.
Afinal, se Deus é amor, por que existe dor? Se Ele é justo, por que tanta injustiça? Se Ele é poderoso, por que não deu fim logo em tudo que é ruim?
Essa questão não nasceu ontem. Os primeiros cristãos já se perguntavam isso enquanto eram perseguidos. Agostinho, um dos maiores pensadores da história, passou anos tentando entender como conciliar a existência do mal com a bondade de Deus. E, mesmo antes disso, no Éden, Adão e Eva talvez já tenham sentido esse peso: “Por que a árvore proibida estava ali?”
E é aqui que entra o ponto espiritual. O mal não nasceu em Deus, mas no coração de uma criatura que escolheu ir contra Ele. Deus poderia ter apagado Lúcifer como quem deleta um arquivo corrompido — mas então, que liberdade haveria? Que amor existiria sem escolha?
A grande verdade é que essa pergunta, mais do que nos dar uma resposta, nos cutuca a olhar para dentro. Porque não é só sobre por que Deus permitiu o mal “lá atrás”, mas por que nós mesmos, todos os dias, continuamos a escolhê-lo. (Muitas das vezes, inconcientemente)
O Livre-Arbítrio: O Presente e a Maldição
Pensa comigo: se Deus tivesse criado a gente como robôs programados só pra amar, obedecer e sorrir como bonequinhos de vitrine, que valor teria esse amor? Seria real? Claro que não. Amor sem escolha é só teatro mal ensaiado.
É por isso que o livre-arbítrio entra na jogada. Ele é, ao mesmo tempo, o presente mais lindo e a maldição mais perigosa que recebemos. É o que faz o “sim” ter valor, justamente porque existe a possibilidade do “não”. Se Adão e Eva nunca tivessem tido a chance de desobedecer, nunca teriam realmente obedecido — só estariam cumprindo um script.
E aqui está o ponto filosófico e espiritual: Deus não queria fantoches. Ele queria filhos capazes de amar de verdade. Mas dar essa liberdade significa aceitar o risco de que alguns escolheriam se rebelar. Foi isso que aconteceu com Lúcifer, e depois com a humanidade.
Na história, a gente vê ecos disso o tempo todo. Reis que deram poder ao povo e depois foram traídos. Líderes que confiaram em conselheiros e foram derrubados. O livre-arbítrio é esse poder: você pode usá-lo pra construir reinos ou pra destruir a si mesmo.
E o mais curioso? O mal só existe porque o bem existe primeiro. A sombra só faz sentido porque há luz. Se Deus tivesse apagado a possibilidade do mal, teria apagado também a beleza da escolha, a grandeza da liberdade.
Então sim, meu caro leitor: o mal não é prova da ausência de Deus. É justamente a prova de que Ele nos deu algo que nenhuma máquina, nenhum animal e nenhuma inteligência artificial jamais terá: a liberdade de escolher.
O Papel de Lúcifer na História
Agora vem a parte que muita gente evita falar: se Deus sabia que Lúcifer iria se rebelar, por que criou ele assim mesmo?
Primeiro, precisamos entender que Lúcifer não nasceu “o vilão”. Pelo contrário: ele era descrito como “o mais belo dos querubins”, cheio de sabedoria, música e brilho. Imagine a cena: a criatura mais perfeita que já existiu… e ainda assim, dentro dele, nasceu o desejo de ser mais do que o Criador.
Aqui mora a lição filosófica: a perfeição não garante fidelidade. Lúcifer tinha tudo, mas queria ser “Deus no lugar de Deus”. O mal, então, não começou fora, começou dentro — como uma semente de orgulho, que cresceu até se transformar em rebelião.
E por que Deus não simplesmente o destruiu na hora? Fácil: se Deus tivesse apagado Lúcifer como se apaga um arquivo no computador, qual seria a mensagem para os outros anjos? Que Ele não aceita perguntas? Que Ele reina pelo medo? Isso não seria amor, seria tirania.
Deus, em vez disso, permitiu que a história se desenrolasse. Ele deixou que o mal mostrasse sua verdadeira face. E cá estamos nós, milhares de anos depois, colhendo os frutos dessa rebelião.
Na história da humanidade, vemos paralelos claros: líderes que começam bem, mas se corrompem pelo poder; impérios que ruem por causa do orgulho; sociedades que escolhem a vaidade em vez da verdade. O mesmo script se repete, desde o Éden até hoje.
E aqui entra a reflexão espiritual: Lúcifer é o espelho do que acontece quando a liberdade é usada sem sabedoria. Ele teve tudo, mas escolheu o nada. Ele tinha a vida, mas abraçou a morte. E Deus permitiu… porque só assim a liberdade faria sentido.
O Propósito do Mal no Mundo
Essa é a parte que dói, mas que liberta: o mal tem um propósito. Não porque Deus gosta dele, mas porque Ele consegue transformar até o veneno em remédio.
Pensa comigo: como alguém sabe o valor da luz, se nunca experimentou a escuridão? Como alguém entende a força da vida, se nunca sentiu o peso da morte? Como alguém descobre a beleza da bondade, se nunca foi ferido pela maldade?
É duro admitir, mas o mal funciona como um espelho incômodo, que revela onde estão nossas escolhas. Ele mostra a podridão que nasce quando o orgulho, a ganância ou a inveja tomam conta. Sem essa experiência, seríamos eternas crianças espirituais, incapazes de compreender a seriedade da liberdade que carregamos.
Na filosofia, isso aparece como a ideia de contraste: nada é valorizado sem seu oposto. Na história, vemos impérios que só caíram porque o mal dentro deles cresceu demais — e isso abriu espaço para novos começos. No espírito, vemos que o mal não é a palavra final: ele é apenas a tela escura onde a luz de Deus se destaca ainda mais.
E talvez aqui esteja o maior mistério: Deus não criou o mal, mas permitiu que ele existisse para revelar o valor do bem. É como se Ele dissesse: “Vocês têm escolha. E as escolhas têm consequências.”
No fim, o mal expõe nossa alma. Ele nos obriga a decidir se vamos nos corromper junto ou se vamos usar a dor como combustível para crescer. Ele nos lembra que não somos eternos aqui, e que cada decisão, por menor que pareça, constrói o caminho do nosso espírito.
Porque, no fundo, a questão nunca foi sobre o mal em si… mas sobre o que nós fazemos com ele.
5. A Resposta de Deus ao Mal — Amor que Entra na Dor
Quando a pergunta é “por que Deus permite o mal?”, a resposta definitiva não é um argumento abstrato — é uma presença. Deus não responde ao sofrimento com teorias, responde vindo para dentro dele.
1) Deus que entra na dor
A primeira e mais clara resposta é que Deus não ficou distante observando. A narrativa espiritual mais pungente é a de um Deus que assume a pele humana, caminha pelo deserto, chora na sepultura do amigo, sente a traição e encara a cruz. Não é apenas uma postura teórica: é um ato de solidariedade absoluta.
Isso muda tudo: não é um juiz distante que decretou sofrimento; é um companheiro ferido que conhece cada lágrima.
2) Amor que redime, não que elimina escolhas
Deus deu liberdade porque sem escolha não há amor. Quando o mal acontece, o amor de Deus se revela não como força que retira a liberdade, mas como presença que cura e transforma escolhas ruins. A resposta divina é oferecer perdão, reconstrução e caminhos de restauração — não anular a responsabilidade humana.
3) Sofrimento transformado em significado
Há um mistério: o sofrimento pode atrofiar ou pode purificar. A resposta de Deus, na narrativa espiritual, é usar o sofrimento como matéria-prima de transformação — não para justificar a dor, mas para lhe dar possibilidade de sentido. Gente que se recusa a sucumbir à amargura encontra na dor a força para compaixão, para serviço, para curar outros.
4) Justiça que ainda está por vir
A promessa espiritual não é imediatista: Deus promete que a injustiça terá fim. A esperança religiosa sustenta que o mundo está em processo — que histórias não terminam na violência e no abuso, mas há um desfecho onde a verdade e a justiça triunfam. Essa é uma resposta de horizonte: enquanto hoje há dor, existe um amanhã prometido de reparação.
5) Chamado à responsabilidade humana
Deus permite a liberdade e, com isso, chama-nos a responder. A melhor resposta que podemos dar ao mal é: ser agentes do bem. Combater injustiça, curar feridas, proteger os fracos — essa é a cooperação humana com a obra redentora. Deus não resolve tudo sozinho; convida-nos a participar da cura do mundo.
6) O consolo prático — presença, cuidado, silêncio e ação
Para quem sofre, as grandes provas não são argumentos teóricos, mas gestos: alguém que fica, que acolhe, que chora junto, que age. A resposta de Deus se manifesta muitas vezes através de pessoas que amam sem perguntar por que; através de mãos que ajudam; através de silêncio que não abandona.
Busque entender e absorver o seguinte…
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Deus não causou o mal; Ele permitiu liberdade para que o amor tivesse valor.
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Em vez de eliminar a liberdade, Deus entra na dor — é presença, sangue nas feridas e promessa de cura.
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O mal tem consequências, mas não é a palavra final: há redenção, justiça futura e convite humano à ação.
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A verdadeira resposta que transforma não é argumentativa — é relacional: estar com o outro, curar, reconstruir.
7. “Deus me abandonou!” — O Silêncio que Revela Distância
Muitas vezes, no meio da dor, o ser humano grita: “Deus me abandonou!”.
Mas será mesmo?
1) A presença que nunca falha
A espiritualidade antiga é clara: Deus não muda, não dorme, não esquece. Se Ele é amor, como poderia virar as costas? O problema não está em Deus, mas em como o ser humano se coloca diante d’Ele. O silêncio que sentimos não é ausência divina, é barulho humano demais dentro de nós.
2) O afastamento pelas escolhas
Quando as decisões se repetem sem considerar o sagrado — orgulho, egoísmo, ganância, indiferença —, vamos criando camadas. É como tinta sobre vidro: a luz ainda está ali, mas não conseguimos mais vê-la. O coração se acostuma com a própria autonomia e confunde liberdade com desligamento.
3) O “abandono” que vem de dentro
O que chamamos de “abandono de Deus” na verdade é um autoabandono espiritual. É como desligar o rádio e depois reclamar que a estação não está transmitindo. Deus continua emitindo sinais; nós é que nos afastamos da frequência.
4) O silêncio que pode ser convite
Às vezes, até quando Deus parece distante, não é ausência: é convite. O silêncio pode ser uma forma de despertar, de nos chamar de volta ao essencial. Como um pai que deixa o filho aprender sozinho para que amadureça, mas nunca solta a mão de verdade.
5) A volta sempre possível
A grande notícia é que nenhuma distância é definitiva. O ser humano pode gritar do fundo do poço, e ainda assim, o eco encontrará resposta. Porque Deus não some, não apaga, não corta laços: Ele espera. Ele escuta. Ele permanece.
Não é Deus quem abandona o ser humano; é o ser humano que, ao se encher de si mesmo, perde o espaço para sentir Deus.
Conclusão
No fim, toda essa reflexão sobre o mal, a dor, o silêncio e até a sensação de abandono nos leva a um ponto: o princípio. O Arkhé.
Tudo começa e termina em Deus.
Ele não criou o mal para que o ser humano sofresse, mas nos deu liberdade — e com ela, a possibilidade de escolher até contra Ele. Essa liberdade é pesada, às vezes cruel, mas é também a maior prova de amor: não somos robôs programados, somos livres para amar ou rejeitar, para buscar ou ignorar.
Quando sentimos que Ele se foi, na verdade é porque nos afastamos do princípio, do Arkhé. O fio nunca se corta, mas nossa percepção se turva. A boa notícia? Sempre podemos voltar. Sempre há caminho de retorno ao centro, à origem, à fonte.
👉 O Arkhé não é apenas o começo do universo, é o começo dentro de nós. Cada vez que paramos, respiramos e lembramos que não estamos sozinhos, retornamos à essência.
A vida só encontra sentido quando volta ao seu ponto inicial: o princípio que é eterno, o princípio que é amor.
No fundo, nunca é Deus que nos abandona. Nós é que nos perdemos das nossas próprias origens. Voltar ao Arkhé é voltar a Ele.